Entretanto, quanto ao que mostra a Escritura, que as boas obras dos fiéis são
causas pelas quais o Senhor os galardoe, isso se deve entender de maneira que em
nada se prejudique o que já dissemos, ou, seja, que a causa eficiente de nossa salvação
reside no amor de Deus, o Pai; a causa material, na obediência do Filho; a
causa instrumental, na iluminação do Espírito, isto é, na fé; a causa final é a glória da incomensurável benignidade de Deus. Nestas, nada impede a que o Senhor abrace
as obras como sendo causas inferiores. Mas, donde procede isto? Com efeito,
aqueles a quem, em sua misericórdia, ele destinou à herança da vida eterna, a esses,
por sua administração ordinária, ele induz à posse por meio das boas obras. Ao que
precede na ordem de sua administração, ele intitula causa do que se segue. Desta
forma, ele às vezes deduz a vida eterna das obras, não que se deva referir-se a elas
como a coisa admitida, mas porque justifica aqueles a quem escolheu para que, por
fim, os glorifique [Rm 8.30]. A primeira graça, que é como uma escalada para a
segunda, de certa maneira é chamada sua causa.214 Sempre que, porém, se faz necessário
assinalar a verdadeira causa, ordena recorre-se não às obras, mas que nos
mantenhamos unicamente na consideração da misericórdia. Pois, que significa isto
que ensina através do Apóstolo: “O salário do pecado é a morte; a graça do Senhor,
a vida eterna” [Rm 6.23]? Por que ele não opõe a justiça ao pecado, como opõe a
vida à morte? Por que então não estatui a justiça como causa da vida, como estatui
o pecado como causa da morte? Ora, assim se formularia corretamente a antítese
que, com esta variação, está um tanto rompida. Mas, o Apóstolo quis, mercê desta
comparação, exprimir aquilo que era matéria de fato: aos merecimentos dos homens
deve atribuir-se a morte; a vida está posta unicamente na misericórdia de
Deus.
Enfim, com essas expressões denota-se seqüência mais do que causa, porque,
cumulando graças a graças, Deus toma das primeiras causa para adicionar as segundas,
para que não deixe algo passar sem enriquecer a seus servos. E a tal grau estende
sua liberalidade que, não obstante, sempre quer que contemplemos a graciosa
eleição, que é sua fonte e início. Pois, ainda que ele ame as dádivas que diariamente
nos confere, visto que procedem dessa fonte, no entanto, nos incumbe de suster essa
graciosa aceitação que é a única que nos pode sustentar a alma; e, além disso, de tal
modo subordina os dons de seu Espírito à causa primeira,que então prodigaliza, que
nada lhe prejudiquem.
João Calvino
Escola Bíblica Conhecedores da verdade - O objetivo deste blog e levar você a conhecer a verdade que liberta de todo o Engano. Nesses últimos tempos, muito se tem ouvido falar do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, porém de maneira distorcida e muitas vezes pervertida, com heresias disfarçada etc. “ ...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” João 8.32